domingo, 29 de janeiro de 2006

Os Retalhos Dos Quais Somos Feitos




Uma pessoa, que nos fez vibrar ao som dos mais simples gestos mas que também nos fez provar o lado mais amargo do gostar, terá o direito de nos voltar a magoar? Ou somos nós que, na credibilidade que ainda resta, permitimos que isso aconteça?

Por vezes, somos vítimas de uma ignorância inocente. Será que gostar de alguém faz de nós mais fracos? Mais susceptíveis de abrir o caminho para que o outro nos magoe?

O aspecto de uma pessoa pode iludir os outros a verem uma fragilidade que apenas é aparente. Por dentro, na realidade, essa pessoa pode revelar-se de uma força extraordinária que surpreende, mais cedo ou mais tarde, aqueles que a julgaram de "porcelana". Mas se essa força é benéfica para a personalidade e para o pensamento, nem sempre se revela generosa aquando do surgimento de novas relações.

Acompanha-nos a incapacidade de apagar o efeito que tudo pelo que passamos deixa em nós. Por mais racionais que tentemos ser, nem a própria razão apaga o retalho que foi cosido à nossa vida, que nos trouxe mais sabedoria e que tem a marca única da pessoa que conseguiu importância suficiente para o coser.

Seremos nós capazes, com o tempo, de fazer descoser ponto a ponto, caso a pessoa não velar pelo seu lugar na nossa vida? Poderemos perder tudo o que ganhamos e aprendemos com ela, correndo o risco de, a partir desse momento, passarmos a tropeçar no vazio em que se transforma, onde outrora teria o seu lugar. Porque existem sempre recordações boas, momentos que nos fazem sorrir, mesmo que o sentimento já não seja o mesmo, são linhas que fazem parte de nós.

Só o tempo dirá, mas neste momento, é a única coisa para a qual não tenho força: rasgar, com as minhas mãos, os retalhos que ostentem essa mesma necessidade.

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